terça-feira, 27 de novembro de 2007

Se conduzires...

Estás a pilotar um carro e manténs uma velocidade constante. Do teu lado esquerdo encontra-se um cisne enorme. Do lado direito um grande carro de bombeiros, que mantem uma velocidade idêntica à tua. À tua frente galopa um cavalo, que é bem mais alto do que o teu carro, e não consegues ultrapassá-lo. Atrás de ti vem um helicóptero rente ao chão. Tanto o cavalo como o helicóptero mantêm uma velocidade idêntica à tua. O que fazes para sair desta situação em segurança?
Pensa um pouco...
Mais um pouco...
A resposta está mais abaixo....

Resposta:Sai do carrossel e deixa de beber, que o álcool está a dar cabo de ti....

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Arquimedes em São Tomé e Príncipe

«Dêem-me uma alavanca e um ponto de apoio e levantarei o mundo». As palavras pertencem ao famoso matemático e inventor grego Arquimedes (287 a.C - 212 a.C). Se o famoso matemático tivesse oportunidade para passar por São Tomé e Príncipe pelos dias que passam, quase aposto que repetiria aquelas palavras. Mutatis mutandis diria: venha o petróleo, mas se quiserem desenvolvimento dêem-me um ponto de apoio. Qual seja o ponto de apoio, o leitor já antevê: instituições.
Só que o famoso matemático era um inventor. Ele perguntaria quais instituições, que instituições melhor servem este povo, como modelar o rule of law num contexto institucional operacional?, antes de embarcar em soluções de transplantes, evitando assim o Complexo de Frankenstein. Arquimedes, também famoso pelo eureka, eureka não cairia de bruços em soluções importadas... teria cuidados dobrados de geometria institucional e apuraria as articulações da mecânica/dinâmica social, estudaria os pergaminhos culturais, históricos e da antropo-sociologia do povo santomense.
Importa por isso responder a questões prévias que circunvoam – quais abutres advinhando o repasto necrófago sobre as actuais instituições - o presente condicional ou o antevisto futuro-mais-que-imperfeito de São Tomé e Príncipe.

sexta-feira, 26 de outubro de 2007

Show me the money: o dinheiro dos nossos emigrantes

O relatório Sending money home: Worldwide remittances to developing countries, do Fundo Internacional para o Desenvolvimento Agrícola (em inglês: International Fund for Agricultural Development/IFAD) em parceria com o Banco Interamericano para o Desenvolvimento (Inter-American Development Bank/IDB), dá-nos uma imagem pollaroid do fluxo de remessas dos imigrantes mundiais em 2006. Alguns dados:

  • 150 milhões de emigrantes mundiais contribuíram com cerca de 300 mil milhões (não confundir com o anglo-saxónico billion) de dólares americanos;
  • África recebeu cerca de 40 mil milhões de dólares americanos da sua diáspora (de 29 milhões de cidadãos);
  • As remessas foram essencialmente utilizadas para prover às necessidades básicas (alimentação, vestuário e alimentação);
  • Mundialmente, uma parcela entre 10% a 20% foi destinado a poupança;
  • Em São Tomé e Príncipe, estima-se que as remessas corresponderam a cerca de 39% do PIB (o segundo maior em África a seguir à Guiné-Bissau: 48,7%).

O relatório conclui que há ineficiências na qualidade dos dados obtidos e no custos das transferências. No entanto e sem conceder, insta o mundo a transformar as remessas numa ferramenta de desenvolvimento mais eficaz. A ler, reflectir e exgir resultados na Cimeira Euro-Africana (Mugabe incluído). Vale também exigir aos Estados que tratem melhor a sua diáspora que, pelos vistos, merece mais e melhor que os simples abandonos e palavras de ocasião.

sexta-feira, 19 de outubro de 2007

Lisboa: a reformadora europeia

enquanto eu dormia, o primeiro ministro português e o presidente da comissão europeia anunciavam e molhavam em champagne o novo texto reformador europeu. só lhes faltou repetir o grito de vitória de sócrates: conseguimos. depois de eu ter acordado ao sabor das novidades, sublinho quatro aspectos interessantes que resultam desta noite:
i) dormi sossegadamente. não me importei com a falta de apresentação das prioridades e dos interesses nacionais. afinal de contas vem aí o dinheiro que, no fundo, resolve o nosso problema de falta de prioridades políticas e de ambição nacional;
ii) acabei por acordar do pesadelo do referendo. já ontem o brownie inglês, de nome gordon, me tinha tirado o sabor amargo de um referendo inútil que apenas serviria de mote para o portugueses discutirem algo de nevrálgico cuja discussão é imperativa haja ou não referendo. o referendo não pode justificar a discussão dos problemas europeus;
iii) ainda sobre o referendo. a falta dele e o compromisso secreto dos líderes em dispensa-lo não pode deixar de ter uma leitura política: a europa não foi aprofundada, foi apenas... remendada;
iv) tive um sonho fantástico. sonhei que o governo português afinal é capaz de diálogo e de compromissos. parece que depois disso, sócrates não terá desculpas para escutar as necessidades dos portugueses apenas com ouvidos de mercador.
antes de partir, e apesar da posição de submissão política (por falta de ambição substancial), está de parabéns o país e devemos estar felizes : o país afinal é capaz de grandes feitos. e a grandeza da história portuguesa não acabou com o fim do império. hoje também é capaz de fazer história, apesar da ordem de grandeza ser outra. parabéns portugal.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

Um livro escrito nos rodapés

Cá estou, hoje sem muito que dizer, nem com vontade de saltitar entre uma linha e a esquina da minha rua onde vejo um homem a fumar, a tomar num gesto a cigarrilha da gabardine, a apalpar um bolso, e outro Ora que porra não encontro a m... d'
o esqueiro,
a ter de procurar na mala, que pousa, que abre e lá encontra no meio dos papeis uma recordação da Pensão onde passou a noite anterior, donde saiu sem fazer a barba que coça quando leva a primeira passa, que inspira suavemente Ah caramba porque sente o prazer entrar-lhe nos pulmões, enquanto olha para o relógio também, e esquece-se que está adiantado,
(não atrasado porque o autocarro das 7:40 já passou e agora está adiantado para o próximo) e que o autocarro só passa quando passar, porque é o especial, que só vem quando chega e mais uma vez Vou chegar atrasado, caramba, porque nunca acorda a horas, ou quando acorda, olha para o relógio e pede só mais uns minutos, mais uns cinco e Já me levanto e fecho a janela, para não o ver fugir da ponta do cigarro em fumo, a voar por cima da sua boca, ao canto da esquina
e volto para o meu computador, porque
tenho de sair,
tenho de ir dar aulas na faculdade, e não quero chegar atrasado ou ficar uns dez minutos
que porra
a espera do autocarro. Mas antes de sair, vou buscar o isqueiro, tomar a bagardine e correr com a mala cheia daqueles livros daqueles artigos que os alunos não gostam mas lá tenho de os dizer Olhem que o livro também se escreve no rodapé, mesmo com a barba por fazer e com uma vontade imensa de fumar.

sexta-feira, 12 de outubro de 2007

O mundo é plano...

E eis a prova... Um ratinho estava na toca, encurralado pelo gato o que, do lado de fora, miava: - MIAU, MIAU, MIAU. O tempo passava e ... : - MIAU, MIAU, MIAU. Depois de várias horas e já com muita fome o rato ouviu: - AU! AU! AU! Então deduziu: - Bom, se há cão lá fora, o gato foi-se embora. Saiu disparado em busca de comida... Nem saiu bem da toca e o gato, NHAC! Inconformado, já na boca do gato perguntou: - Porra gato! Que merda é esta? E o gato respondeu: - Meu filho, neste mundo globalizado de hoje, quem não fala pelo menos dois idiomas morre à fome!

segunda-feira, 10 de setembro de 2007

A arte das sombras (vídeo)

Luis Armstrong toma vida nas pontas dos dedos de um artista de sombras e volta a cantar o mítico Wonderful World. Muito artístico... e divertido.

sexta-feira, 27 de julho de 2007

quarta-feira, 25 de julho de 2007

Viste por aí o verão?

na semana passada deixei a sensação de que estava de malas aviadas para férias, levando na bagagem dois livros e o mundo debaixo do braço. deixei no ar o espectro da saudade, num até setembro se deus quiser. no entanto, por boa educação e cautela avisei que se o tempo não soprasse bons ventos me ficaria pelas ondas da rádio. nesse entretanto, troquei as voltas à lista e em vez de um outro livro adicional, preferi pegar no meu computador portátil e assinar um serviço sem fios. vou de verão mas não posso deixar para trás o IMAGINASTICANDO: tenho de escrever posts para o meu blog; tenho de cumprir o meu ritual de cidadania e pertença à blogosfera. este é o meu último post antes de partir. espero que o leitor compreenda: se a tradição (por curta que tenha sido) lhes cunhou o carácter público de um diário íntimo, hoje os blogs e a galáxia onde giram numa velocidade incrivelmente delirante deixaram de ser um fenómeno periférico para passarem a ser um fenónemo absolutamente essencial na sociedade de informação. como dizia o poeta, no início estranha-se, depois entranha-se. a sedução bloguista já não é apenas a do desabafo existencial, mas o do comentário, do facto, da informação, da reflexão, do som, da imagem… e também dos silêncios: os silêncios apressados de cada salto, de cada leitura viciante. é que a blogosfera tornou-se numa grande conversa global na qual o indivíduo se liberta, partilhando ideias e redes de influência, criando novos modos de comunicar; tornando-nos uma espécie de repórteres populares… mesmo se num safari de verão. ao contrário de um livro que nos propõe uma viagem de passiva e nos invade de leitura, o blog promete-nos uma continuidade participativa, documental… cheia de impressões e verões digitais. e porque o tempo continua de maus fígados, não parto apenas para o verão com o mundo debaixo do braço: parto para a blogosfera com a esperança de lá encontrar o verão perdido deste mês de julho. e já agora: espero que agosto não se perca também!

terça-feira, 17 de julho de 2007

Verão: o mundo debaixo do braço

em pleno verão, já com julho a escorrer pela testa e de malas aviadas para um recanto de refúgio também eu não queria ouvir mais uma crónica. queria já ter partido. é que depois de uma temporada de onze meses de trabalho (para os mais afortunados) ou de nove meses de aulas (por mal descontados que sejam), eu respeito o ouvinte que merecidamente declarou aberta a caça ao ócio: começou aquela época do ano em que apenas queremos fazer nada e viajamos para um lugar do não quero nem saber. e apenas nos preocupamos com a nossa lista de livros e lugares de fuga, desligando as preocupações que nos consumiram as energias, a paciência, o talento até,… e o corpo em amassos nos transportes durante quase um ano. nesta época, ver televisão entedia, ouvir rádio compromete. só temos uma saída: pegar em livros e levar o mundo debaixo do braço até à praia, queimando o tempo nas águas descalças e nas areias sentadas num comprimento de onda fresca. por isso, em vez de uma crónica como as de costume, preferia mergulhar nas águas do verão, aviando-me na minha lista de livros, que se resumem a dois: the green king, em inglês, para me tornar as férias mais lentas, para me invadir de mundos novos, escorrendo-me na prosa, na memória, na narração. esquecendo-me, por instantes, do trabalho, da rádio… desta crónica. o outro ainda não sei qual! e, na verdade, nem interessa: apenas servirá para me fazer lembrar: não o vou ler! preciso desse livro extra para me lembrar que estou de férias. e para aquela doce ilusão de ter tempo para mais um. para mim as férias começarão na primeira página do the green king e acabarão quando arrumar o outro livro para voltar para o trabalho. vou começar este verão na lombada de um livro que não sei para onde me levará. e nem estou aí para isso! apenas seguirei o conselho do meu irmão: leva-te neste livro!... e nem me disse porquê. como quem nos oferece um bilhete, boa viagem,… sei que vais voltar. até lá, vou-me deixando invadir pelas ondas da rádio.

segunda-feira, 9 de julho de 2007

Supreenda-me, Mr. President

Quando na próxima 5.ª-feira o Presidente santomense tomar o palanque para proferir o seu discurso, os santomenses estarão a assinalar, com as habituais pompas de circunstâncias, os 32 anos da independência do país. Antecipando o discurso do presidente, e num exercício de quem arrisca não petisca, confesso que me falta originalidade para nesta crónica falar desses 32 anos. E receio que ambos – eu e o Presidente – seremos condenados pela banalidade e pelas palavras de mera conveniência. Talvez ele seja perdoado e comentado por ostentar o nada da marca distintiva de uma classe política falhada e impotente, enquanto eu não me consigo absolver pelo timbre amargurado de não encontrar rasto de sentido e valor de uma independência que nos condenou à pobreza e à servidão democraticamente impostas.
Quase aposto, ou melhor, aposto mesmo com coragem, que do alto do seu saber, o Presidente falará com optimismo do percurso conseguido até aqui: primeiro suspirará sobre a independência proclamada em 1975. Momento de suma importância no qual prometeram aos santomenses alinhar os astros e demais corpos celestes no traçado da história: doravante, o sonho seria nosso, o caminho estaria nos nossos braços. E depois – passados os sonhos e cansados os braços – foi-nos referendada uma democracia, oferecida com mais sonhos, mais promessas e desafios, desta vez desalinhados em vozes e partidos discordantes, sem história nem saudados do futuro. No entanto omitirá, por mera míngua de importância, o facto alguém se ter esquecido de nos dizer que zangas das comadres, as querelas e golpadas pessoais mais ou menos canalhas, mais ou menos reles, e a falta de sentido de estado dessa classe falhada traria consigo a herança colonial e um vírus neo-colonial perigoso em democracia, condenando-nos a um perpétuo estado de meninice nestas coisas do poder e de desenvolvimento.
Para, finalmente, o Presidente proclamar a nova aliança que, com a ajuda do Deus Petróleo e mais doses de corrupção – e em o Diabo não se metendo nos assuntos públicos – em breve nos saudará: a modernidade e o desenvolvimento bombeados em mangueiras, escorrendo nos barris e descarregados dos navios petroleiros. Talvez o turismo e a alta finança também façam parte dessa nova trindade da desilusão. Ou seja, o Presidente resumirá estes 32 anos de perpétuo e falhado processo de descolonização ainda em curso num discurso bem articulado que nos fará esquecer tudo e lembrar-nos de nada. Os nadas que temos para o futuro. Quase ainda arrisco dizer que o Presidente dirá que as novas promessas não podem ser exageradas e só o presente é prudente. Mesmo assim, ouvirei com interesse o seu discurso.
Surpreenda-me, Mr. President! É que, se não for esse discurso do Presidente eu pensarei como muitos: já nem nos prometem nada; já não há estado; está tudo em aberto: quase tudo como há 32 anos. Apenas estamos mais desiludidos. E nem sei se teremos forças para alinhar de novo os astros. Ainda vivemos a independência, Mr. President?

sexta-feira, 6 de julho de 2007

terça-feira, 3 de julho de 2007

Imaginacitando - Pitágoras

  • Escuta, serás sábio. O início da sabedoria é o silêncio
  • Não sabe falar quem não sabe calar
  • Não fales da tua felicidade a quem não for tão feliz como tu

Viveu entre 585 a.C e 495 a.C.. Há taaaaaaanto tempo, mas tãããããoo actual.

sexta-feira, 29 de junho de 2007

segunda-feira, 25 de junho de 2007

O Xerife de Doha e a intuição de Robin

Lançada em 2001 na capital do Katar, a Ronda de negociação de Doha da Organização Mundial do Comércio prometia tirar milhões de pessoas da pobreza. O credo era claro: através intensificação das trocas comerciais, todos ganham! Seis anos depois, o acordo sobre o comércio mundial tarda a chegar, e Potsdam parece ter enterrado a esperança de consegui-lo a breve trecho. No pomo da discórdia continuam as divergências entre ricos e pobres em torno de acessos a mercados e subsídios à agricultura. Ao reflectir sobre os últimos acontecimentos da Ronda Doha, não posso deixar de viajar no tempo e revisitar os meus tempos de gaiato. Nesses tempos, também competíamos, exibindo as naturais vantagens competitivas individuais e colectivas. E nessa altura também todos queriam ganhar: desde o mais fraco ao mais forte. E também aí, a natureza nos dotava de capacidades diferentes que nos levava a colocar a questão: para jogarmos uns contra os outros, ou melhor, uns com os outros, basta aceitar as regras pré-estabelecidas? O jogo, a disputa, o prazer são compatíveis com um excessivo desequilíbro de forças?
A nossa resposta era a da justiça intuitiva, a das crianças. E naqueles tempos, entendíamos rapidamente que jogar exigia mais do que opor as forças de uns aos outros. Lembro-me das soluções criativas que tínhamos naquela altura: alterávamos as regras, escolhíamos equipas mais equilibradas, independentemente das proveniências, das forças, da natureza; desafiávamos a sorte, através da escolha alternada, primeiro escolhe um e depois o outro; e se ainda assim, no decurso do jogo, a vantagem de uns sobre os outros ameaçava a humilhação ou tornar o prazer numa mera disputa, o sentimento de injustiça logo assaltava ambas as equipas. E então, o golo da equipa mais fraca passava a valer dois, ou um e meio, ou estes tinham o direito a um jogador extra, ou de fazer mais substituições; ou ainda se necessário fosse, o direito de excepção a certas regras, que transpostas para o jogo dos grandes logo seriam sagradas e invioláveis. Naquele tempo, no mundo das crianças, a justiça era intuitiva e passava pelo prazer de jogar em igualdade: eram justas as regras que tornassem os fracos mais fortes e os fortes mais fracos. Infelizmente, todas as crianças crescem e quando de tornam homens de estado, a justiça deixa de ser intuitiva e passa a ser um negócio de calculadoras.
Quando nos tornamos grandes, já não interessa o prazer de ganharmos os dois, ou deixarmos de ganhar por muito. Para as crianças, perder também pode se justo e honroso. Quando crescemos, ganhar é amealharmos lucros e perder é acumular pobreza do outro lado: perder torna-se natural para os outros. É pena que os grandes quando ganham poses ou posses de Estado percam o estado de justiça e que ao crescerem, o Robin dos Bosques que vive no coração das crianças seja vencido por um Xerife de Nottinghan, que com punho de ferro empurra o sentimento de justiça para considerações que nos fazem perder o sentimento de humanidade que habita nas crianças. Essas não prometem nada! Mas, no mundo delas... todos ganham.

sexta-feira, 22 de junho de 2007

David Cooperfield

Arte

Afinal havia outro: o G.G.A. gate 1 (cont.)

A propósito deste assunto (que de coluna vertebral se trata), dispense-me o leitor um momento para partilhar as seguintes reflexões (prometendo ser breve para não vos estorvar o descanso se é pagão, ou o trabalho se sois bom cristão):
a) todas as sociedades assentam em instituições que a mantêm e fortalecem. Essas instituições desempenham funções que visam garantir uma ordem resultante do consenso, ou, pelo menos, visam evitar ou dirimir o caos que resulta dos conflitos;
b) ao Estado cabe o monopólio da força e do poder judicial (o poder de julgar e obrigar pela força, se necessário), mas é na sociedade que repousam os valores, não só da tradição, mas e sobretudo aqueles que a habilitam a manter-se em funcionamento;
c) é necessário que o Estado satisfaça ou realize as expectativas da força reivindicativa desses valores;
d) a justiça é um desses valores. Ainda que sendo um conceito abstracto, os juízes (e os tribunais) são realizações institucionalizadas desse valor;
e) (seguindo de perto os ensinamento de F. A. von Hayek – dispenso apresentações: click o nome para desenvolver conhecimentos sobre o autor – acerca da ordem espontânea, lei, legislação e papel dos juízes), creio que os juízes devem : i) descobrir o sentido normativo social; ii) articular ou explicitar as expectativas sociais de justiça e moralidade no/do caso concreto; e iii) garantir o sistema de prémio e o castigo nas disputas;
Em (todos sabemos onde vai aportar uma sociedade que toma o rumo que a STPense parece estar a trilhar: o Estado perde autoridade e credibilidade,
Nicholas Shaxson considera que a soberania é o activo mais transacionável do país (v. Poisoned Wells - the dirty politics of african oil, 2007:145) e essa soberania está a venda na Assembleia Nacional: Rafael Branco afirma em entrevista ao Diário de Notícias (19, de Junho de 2007) que o Governo compra deputados; como quem diz, os deputados vão vendendo quotas-partes de soberania;
a sociedade degrada os seus valores;
os indivíduos perdem esperança e não vêem oportunidades no fundo do túnel)
f) resta um garante da ordem e do sentimento de justiça e moral: a justiça que pune os prevaricadores e premeia os respeitadores conjuga a confiança e a estima social. Todos os consensos partem de uma base de justiça: é preciso que ela se realize.

Afinal havia outro: o G.G.A. gate 1

No comentário desta semana (Debate Africano que vai para o ar no próximo domingo) abordei o GGAgate. Quando pensava que estava a assistir ao encanto do cisne da justiça santomense em dois actos, eis a surpresa Afinal havia outro: o GGAgate 1. O caso remonta a 1996 e dele foi lavrado Acórdão (em plenário) do Supremo Tribunal de Justiça (STJ: Ac. 21/98, de 29 de Outubro de 1998), em sede de Acção de Investigação e Julgamento de Contas relativa à execução do Orçamento Geral de Estado de 1996. Apesar do "douto" acórdão não ser um objecto de grandiosidade jurídica
(nem no estilo, nem no conteúdo, nem no cuidado da língua)
dele retiro quatro perplexidades:
1.ª O processo foi mal instruído:
tanto o PGR, que devia ter zelado pela boa instrução do mesmo, como os diversos protagonistas (passando por membros do então Governo) sonegaram ou simplesmente não juntaram provas: aquele cito «deveria descortinar os factos considerados ilícitos financeiros pelo Ministério Público», devendo qualifica-los adequadamente e juntar provas bastantes, sic; estes (do Governo) com desenfronhada pacatez dispensaram-se de entregar ao STJ os documentos do processo de Contas do Estado, depois de terem tomado do GGA empréstimos ou autorizado despesas como se de coisa sua se tratasse. Esteve bem o STJ ao ter tido um golpezinho de lucidez na sua artística peça de museu ao verbalizar que «o GGA não é uma instituição bancária para conceder créditos às instituições públicas e pessoas privadas».
2.ª Assistimos a uma paradoxal (ilegal? Nada disso: é mesmo trapalhada jurídica de) condenação sem culpa:
O douto relator (acompanhado pelo séquito dos seus pares) assina a seguinte doutrina, em jeito de conclusão: «agindo os responsáveis da Administração do Estado [tal e tal], citados neste processo, sem dolo e que as despesas efectuadas inscrevem-se no âmbito do funcionamento dos seus serviços o Supremo Tribunal de Justiça releva as responsabilidades financeiras em que estão incorridos, porquanto não está demonstrado que as respectivas condutas tiveram por finalidade a obtenção de vantagens ilícitas em proveito pessoal ou para terceiros». Olimpicamente, esclarecem os doutos juízes: «essas infracções ou irregularidades foram cometidas sem culpa grave, pelo facto de ter-se demonstrado que estes ilícitos financeiros foram cometidos para financiar despesas públicas». Isto embora tenham, estes juízes supremos, considerado que - ilustro a título de mero exemplo das pérolas doutrinárias que decoram aquela peça judicial - «houve despesas com actividades de carácter socia[l], pagamento de complementos de salários e enormes despesas com um assessor para a recolha de informações, embora haver serviços do Estado competente para o efeito, pagamento este[s] que são considerados indevidos». Ainda assim, condenam as pessoas constantes da misteriosa lista anexa
(que espero que venha a conhecer a luz do dia, saindo das trevas da ignorância)
à responsabilidade reintegratória. (Alguém quer perceber a racionalidade? Faça o favor!)
Pelos lidos os senhores ex-ministros e ex-responsáveis do Palácio do Povo não constam da lista, se se atentar à argumentação do tribunal.
3.ª Aparentemente, o MP [à época e dentro do prazo de prescrição] não accionou as pessoas identificadas pelos crimes de lesa património do Estado.
4.ª e por esta me fico: a condenação do STJ
- ficam os culpados que agiram sem culpa condenados à reintegrar os usos impróprios
caiu em saco roto (valha-nos o jornalismo que não deixou o saco morrer em paz)
Tendo o STJ condenado aquela multidão anónima (pelo que para anexo são chutados, qual ratos de porão), ao que relata o Tela Nón, ninguém pagou (aliás, são uns ninguéns irresponsáveis e anónimos encobertos pela burka do anexo chutado para o escuro) e pelos vistos o outro ninguém, o que dá pelo nome de Ministério Público, nada faz para executar essas dívidas ao Estado. Que faça as contas e veja se ainda pode correr atrás dos prevaricadores dos bolsos do Estado.

segunda-feira, 18 de junho de 2007

Senhora Macbeth

Há peças que nos enchem os olhos, não pelo cenário (minimalista, uma mão criminosamente denunciada, três cadeiras e luzes descidas das amarguras) mas pela actuação vertiginosa de Marília e das suas "bruxinhas". O espectáculo, a que assisti no dia 16 de Junho prendeu-me à cadeira. Depois disso, é difícil não se render à Marília, digo: à Senhora Macbeth. Tive pena das palmas: Marília e as suas "bruxinhas" mereciam mais do que o frágil crepitar de pipocas dentro de uma panela: mereciam sons ensurdecedores de foguetes.

Quase pensamento

Ou eu já não percebo nada, ou concluo por coisa nenhuma. Fujo do ócio como que pelo buraco da fechadura - tira-me deste lugar louco, inferno! imaginasticando as pernas, o teclado, o caracter escorregadio em Arial, 10, simples apago-me (apega-me, a) em tintas doces de olhar cinzento - desliga-me a porra da impressora, deixa-me evadir, deixo-me invadir, a porra da impressora, o metralhar do teclado, raios! louco, triste, quase torturado, como duas bolachas presas numa dentada apago o cinzento, afago o cinzeiro da tarde triste que se esvai entre os dedos (tiro da sacola um pedaço de tempo, um passado) entre um olhar, já não percebo nada, deixa-me pensamentindo, descansado, torturado entre duas frestas de sonho ou (como que por devir) concluo por coisa nenhuma como por brincadeira

Momento de areia

se eu soubesse ou pudesse escrever na beira da areia descalçava-me dividido entre a página de um livro e a linha ondulada no horizonte, como se fosse um dia normal (à beira da areia) desfazendo-me entre um olhar perdido e as palavras das ondas

E Deus criou a mulher

Um blog só aparentemente para homens http://edeuscriouamulher.blogspot.com/

Tabú: entre a brevidade das promessas e a longevidade dos resultados

Durante três dias, esteve reunida a 17.ª sessão do Fórum Económico Mundial. Desta vez, na cidade do cabo para «elevar a fasquia» da boa esperança ao continente africano. Os tópicos foram os do costume: competitividade e crescimento económico; o toque de caixa o de sempre: são precisos mais planos de desenvolvimento; mas desta vez o presidente anfitrião, Tabu Mbeki, considerou que África não precisa de um só plano de desenvolvimento: precisa de vários, tendo em conta que não se deve generalizar sobre o que o continente precisa para o seu desenvolvimento sem ter em conta os seus 54 países e as dezenas de comunidades e arranjos regionais.
Apesar de Mbeki ter razão quanto às necessidades nacionais ou das comunidades regionais, penso que não há qualquer falácia na generalização de um plano para o continente. É que não se pode deixar de lado os denominadores comuns que estão identificados há muito e que permitem, em poucos factores e com ganhos de coordenação, apreender a visão de conjunto e os elementos indutores de desenvolvimento.
Na verdade, apesar da diversidade dos países e das regiões, a competitividade e o crescimento devem ser tomados em conjunto, para que os efeitos sejam de escala e multiplicadores. Esse desenvolvimento conjunto passa pela criação de condições para acesso a investimento, ferramentas de conhecimento, factores de sustentabilidade e de mercados. Por seu turno, crescer e tornar competitivo os países africanos pressupõe libertar o potencial criativo e empreendedor dos africanos: criar empreendedores locais, capazes de participar no processo de geração de emprego, riqueza e mercados internos.
Onde quer que se situe o desafio do desenvolvimento africano, é necessário investimento no factor humano, nas infra-estruturas, no ambiente de negócios, mas também na criação de mercados. Para isso, é necessária uma comunidade de vontades políticas continental que entenda que o poder político que possuem deve ser utilizado para induzir bem-estar geral, criação de factores locais de aquisição de uma mentalidade de acumulação de direitos sejam eles políticos ou económicos. Em suma, para elevar a fasquia são necessários mais do que os planos do costume.
Entre a brevidade das promessas e a longevidade dos resultados, há todo um continente que espera acções concretas e simples: acções que visem libertar o potencial dos africanos e que lhes insufle a vontade de construir o seu próprio desenvolvimento. Para isso não são precisos planos de desenvolvimento: são precisos planos de liberdade política e económica.

terça-feira, 12 de junho de 2007

Emerging Hope from Africa

Um texto da presidente da Libéria, Ellen Johnson Sirleaf, publicado no Project Syndicate (v. Imaginásio) que relata algumas das novas faces de África. Vale a pena (re)ler...

segunda-feira, 11 de junho de 2007

Uma cimeira, um ditador e um jornalista

A cimeira EU-África é um dos tópicos prioritários da agenda portuguesa para a presidência da união europeia que Portugal assume no próximo dia 1 de Julho. A decisão é reconhecida como importante, mas o consenso quanto à realização da cimeira dilui-se. É que mais uma vez, Robert Mugabe ameaça ser a espinha atravessada na garganta: de um lado, há os que defendem que a cimeira não se pode realizar com o sr. Mugabe; de outro lado, há os que defendem que a cimeira só se pode realizar com o sr. Mugabe.
Como fiel da balança, Portugal estabeleceu um critério político que separa as águas e permite as negociações para realizar a cimeira: África não é o sr. Mugabe e o sr. Mugabe não é África. Neste critério simples, está resumido um conhecimento actualizado do continente. Infelizmente, este critério, que é político e actual é rejeitado pelo director do jornal de referência português Público, José Manuel Fernandes, que considera que a realização da cimeira não pode significar a emissão de um visto de entrada ao sr. Mugabe. Com efeito, diz o sr. Director do Público, a presidência portuguesa não pode ignorar o dever de ajudar África nem o dever de exigir aos seus governos que respeitem os direitos humanos. Somente uma visão demonizada e arcaica acerca do continente pode ficar limitada aos habituais e velhos clichés – aliás, acompanhado por outro comentador de fim-de-semana no Expresso –, tomando a parte pelo todo, e não reconhecendo o lento mas sólido caminho de abertura política, que entre simulacros de eleições e verdadeiras manifestações da vontade popular, África tem percorrido, não porque se trata da tradição dos valores ocidentais mas porque as liberdades são parte do pulsar próprio das pessoas, sejam africanas ou não.
É que, se é de democracia que se fala, então porque não ajudar os povos africanos a exigirem e pressionarem os seus próprios governos, através de sanções mais inteligente? Por onde tem andado o estimado sr. Director que não tem lido o que se passa em África, o que dizem as sondagens e os estudos académicos realizados no continente nas últimas décadas?Seja lá onde tenha andado, a verdade é que a democracia e as liberdades são condições concretas de vida e subsistência dos povos: os africanos sabem-no e têm-no dito.
Alguns podem pensar que são questões de princípios e de vértebras políticas que de tão inflexíveis, devem impedir a realização da reunião. No entanto, a vida das pessoas e dos povos não se passa na abstracção do pensamento arrojado, nem nas redacções dos jornais europeus: passa-se debaixo de medidas de governos concretos, muitas vezes dispensando armaduras ideológicas, mas não as armaduras com que reprimem aqueles que os repudiam no seu quotidiano.
A diplomacia portuguesa deve fazer tudo para realizar a cimeira, venha ou não o sr. Mugabe e os seus velhos amigos: eles não representam a nova face africana e essa face não merece ser castigada pelos sucessos que tem acumulado. Mas ainda assim, juntemos mais um motivo para que a cimeira se realize: diz-se sabiamente que de intenções está o inferno cheio! Ora, a não realização desta cimeira atirará os créditos da Europa para o descrédito total e não estancará a passagem dos poucos créditos que lhe restam para mãos alheias. A cimeira é tão importante para África, que precisa de condições para que as promessas se tornem mais do que espuma, como para a Europa, que se deve mostrar à altura dos novos saberes políticos.
Para finalizar, confio muito mais naqueles amigos que se criticam olhos nos olhos sentados à mesa para decidir aquilo que verdadeiramente importa entre eles do que naqueles que, por motivos ideológicos, se recusam a dialogar. Ainda bem que a diplomacia portuguesa não se decide nos jornais presos ao passado.

segunda-feira, 4 de junho de 2007

Uma boa meia decisão

A decisão de proibir a lavagem de carros na via pública é uma boa decisão. Mas é uma meia decisão. Com efeito, as autoridades santomenses inserem esta medida no âmbito do programa «Cidade Limpa», que visa disciplinar o comércio informal na cidade capital, evitando-se a ocupação selvagem da via pública. Visto do prisma do interesse geral, a cidade limpa desentope a circulação de peões e de viaturas, promove maior higiene e configura a estética da cidade: numa palavra, torna-a mais urbana! Assim, a medida é boa porque traz benefícios colectivos para a cidade.
No entanto, a decisão em si não afecta apenas o cidadão abstracto da ou na capital: afecta especial e concretamente os lavadores de automóveis, sobretudo, os jovens que viam nesta actividade o sustento ou o complemento de sustento familiar. Visto do prisma destes jovens, a decisão é uma meia decisão, porque não indica uma solução para o efeito restritivo agora criado. É que, bem ou mal, estes jovens tinham uma profissão, uma actividade que, muito embora, os tivesse retirado dos bancos da escola, não os atirou para a completa marginalidade, ou para o desespero do desemprego. Agora, no espaço que antes era de liberdade, o Estado criou uma proibição.
Como tentei mostrar brevemente, a decisão comporta vantagens e desvantagens: ela foi tomada porque as vantagens ultrapassaram as desvantagens. No entanto, só é completa a decisão que visa solucionar os problemas por ela criados ou levantados. Assim, onde a lei fecha uma porta, deve permitir condições para a abertura de outras. Sem conceder na necessidade de qualificar a vida urbana, as autoridades santomenses não podem deixar de criar um ambiente social que possibilite a estes jovens tomar uma decisão que lhes permita perseguir um caminho por eles definidos; é preciso ajuda-los a obterem a sua independência financeira através de criação de políticas orientadas para oportunidades que despertem o saber, as capacidades e a vontade empreendedora destes jovens: forças essas geradoras de riqueza ou apenas de mais uma história de sucesso!
A busca de trabalho, sucesso ou de apenas felicidade! pelos jovens não deve acabar como um conflito cego entre autoridade e liberdade, mas sim como uma gestão adequada e justa de oportunidades!

segunda-feira, 21 de maio de 2007

Parabéns, África!

A poucos dias de se comemorar mais um dia de África, não posso deixar de me associar aos preparos comemorativos. Desta vez, o sabor do 25 de Maio lembra-nos as utopias sentidas há 50 anos por Kwame Nkrumah – «Procurem primeiro o reino político, e todas as outras coisas virão a seguir.» - no início da primeira onda das independências, que começou no Sudão, Marrocos, Tunísia (1956), Gana (1957) e Guiné (Konakri; 1958). 50 anos depois, muitos dirão que já/ainda não há motivos para comemorar. Ao contrário dessas vozes (adeptos de um certo afro-pessimismo), penso haver razões que nos habilitam a comemorar e festejar (há razões para o afro-reconhecimento). Com efeito, nesse período:

– Criamos uma Organização da Unidade Africana (25 de Maio, 1963), agora União Africana (9 de Julho, 2002), ligando as vontades políticas de Norte ao Sul do continente;

– Vencemos o Apartheid e começámos a criar sociedades e regimes mais abertos, mais justos;

– Iniciámos a internalização de soluções africanas (a kind of an African way) para as questões africanas;

– Criamos universidades e centros de investigação científica;

– Nos últimos anos, a economia tem crescido acima dos 5%, acompanhado pelo crescimento de exportações de 37 países para os EUA;

– Temos uma praça financeira – a bolsa de valores de Accra, no Gana – que cresce a níveis das maiores e mais reputadas do mundo (e em 2003 foi a que mais capitalizou em todo o mundo);

– O crescimento do uso de tecnologias de informação/comunicação como o telemóvel e Internet não encontra par em qualquer outra região do mundo.

Sei que estou a simplificar e a mostrar apenas uma das faces da moeda. No entanto, não estou a ser redutor: é que de onde vêm boas notícias, vem esperança! Ao contrário de outras simplificações mais bi-cromáticas (ao velho estilo preto e branco), não creio que estes 50 anos ostentem apenas fracassos: há cores de pequenos e grandes sucessos no caminho percorrido. E é por estas cores que não hesito em soprar as velas de um bolo feito de mulheres, homens, as suas ideias e um destino sempre imperfeito mas esperançoso. Parabéns, África.

domingo, 6 de maio de 2007

Uma maneira esquisita de falar: o caso do acordo ortográfico

começo por uma declaração de interesses: não tenho de fazer provas de escrita da língua, tenho um nome esquisito, com k, n’ e y; e prefiro escrever facto, óptimo, acção e outras tantas palavras de grafia lusa com todas as consoantes, sejam elas surdas ou mudas. dito isto, muitos dos ouvintes já adivinharam que vou falar do acordo ortográfico da língua portuguesa; essa lingua falada por 200 milhões de pessoas a quem por falta de paciência e respeito que o tema me merece, doravante designarei por 200.
de acordo com as últimas notícias que li, o secretario executivo da cplp – esse órgão oficial tão útil quanto fútil aos tais 200 – deseja acelerar o processo para a entrada em vigor do dito acordo. nem mais, ou dito em bom português: na mosca! o que o quotidiano dos 200 exige é mesmo um acordo de língua e o caso português é a esse título exemplar: o acordo ortográfico não desblindará a lista de 57 páginas de nomes próprios proibidos na qual a santa estupidez burocrática portuguesa incluiu como adilson, adriane, aguinaldo, ailton, baltazar, cádio, celisa, didier, elba, edmar, edmilson, holden, iasmine, idalécio, janet, karina, maribel, naomi só para citar alguns dos nomes provados e registados num ou outro dos países dos 200, são escritos em português unificado. sublinho ainda que se os ditos nascessem em portugal, teriam de receber no baptismo as etiquetas administrativas de nomes tão originais como ana, pedro, joao, antónio, joana, luís, josé e outros da mesma colheita.
o acordo também não vai acabar com a presunção legal segundo a qual um cidadão angolano, brasileiro, cabo-verdiano, guiniense, moçambicano, timorense ou santomense que não andou na escola é lusofono mas não fala português, uma vez que continuará a ter de matricular-se nas provas de conhecimento da língua portuguesa para adquirir a licença de uso e porte de nacionalidade lusa. mais!
não adivinho que a partir da entrada em vigor da dita escrita única acabem com os erros de ortografia política, com as redundâncias surdas-mudas burocrático-institucionais, com o medo acentuado de viver paredes-meias com manifestações racistas, xenófobas e nacionalistas que desunem este tão vasto univeso linguistico.mas exemplos a parte e já que em português nos desentendemos, estou convencido que os políticos têm uma maneira esquisita de falar:
falam de prioridades politiquesas esquisitas, para não dizer fedorentas, que não encontram adesão nos ouvidos do cidadão. mas pior que os políticos – e burocratas, que para efeitos fedorentos são joio do mesmo saco – são os cientistas da língua que não percebem que se é de ciência que arrogam o estatuto das respectivas carteiras e carreiras, deviam ser humildes ao estudar e ensinar a língua, a sua estrutura, a sua evolução e a sua correcção, em vez de converterem o objecto de estudo em ideologia e capricho, com mais ou menos argumentos de conveniência prática.
numa era globalizada, ser prático implica a eliminação de barreiras linguísticas impostas por burocracias claustrofóbicas que não percebem que falar português não é um fato cortado nas cortes das academias de letras; que os nomes próprios não dizem respeito apenas à falta de originalidade de que qualquer deles padeça; e que a língua comum serve para comunicar – sendo que os governos não decretam a comunicação – e, nem serve para engenharias pseudo-científicas; ser prático é apenas ser útil. por esses motivos, parece-me que o acordo ortográfico não alterará nada na vida das pessoas. ou seja, e dito em português pudico porque o serviço público desta estação a isso obriga: acho que este acordo é simplesmente medroso. devo, no entanto, esclarecer que, por uma questão de cheiro troquei a ordem do d e do r na adjecticação utilizada.

Os telhados do Sr. Branco

Doze meses passados sobre o início de funções do governo e da minoria coligada, a sentença do povo santomense não podia ser mais lapidar: este governo não presta! Os maiores partidos da oposição, a uma só voz, também condenam o fracasso do governo, que não se coíbe de puxar lustro aos seus galões e insígnias da governação. O que a oposição não vê do alto da sua miopia, é que a sentença popular «o governo não presta» é também uma sentença sobre si mesma, por ser co-responsável pelos insucessos e insatisfações compiladas no último ano.
O caso do bate boca iniciado pelo líder do MLSTP, Rafael Branco, é a este título exemplar: o líder da oposição lançou um panfleto verbal sobre a natureza criminal e aventureira dos currículos de incógnitos ministros, sem apresentar os nomes dos delinquentes comprovados e aventureiros conhecidos, refugiando-se na boca do povo. Aconteceu o esperado... e o líder do MLSTP sabe, ou devia saber, que quem com ferros fere, com os mesmos é ferido e que esse mesmo povo também já escreveu o seu currículo e sobre ele o governo despejaria os populares verbetes. Assistiu-se por isso ao transformar da arena política numa aldeia da roupa branca em que os líderes políticos se tornaram lavadeiras da sujeira pública num exercício de demagogia que apodrece a credibilidade de quem deseja ser alternativa e o MLSTP fica entalado entre a espada do ridículo e a parede da falta de ideias.
A democracia é um processo de vulgarização de histórias de sucesso. Isso garante-se através de valores, regras e instituições e não respeitar esta pauta torna-se um caso de vulgarização da rasteira, da insinuação e uma casca vazia de sucessos. No debate democrático, da oposição esperam-se políticas alternativas, credibilidade e fiscalização responsável. Pede-se que saiba escutar os apelos sociais e as implicações do poder. O pingue-pongue verbal entre o líder do MLSTP e o governo demonstra a ineptidão política para escutar esses apelos e o total desconhecimento das implicações da falta de credibilidade do actor. Não posso decretar a inscrição compulsiva dos líderes na escola democrática, mas peço que os mesmos decretem o recolher obrigatório da roupa suja e a mobilização geral da decência. É que sem decência, a nobre arte da política não passa de uma disputa podre. E como tudo o que é podre, quando nos cai em cima não gostamos do seu cheiro.

segunda-feira, 16 de abril de 2007

A Nigéria reencontrada

A Nigéria encontra-se num verdadeiro teste de regime. Nos dias 14 e 21 deste mês, o povo nigeriano foi e será chamado a dar provas da vitalidade e credibilidade das suas instituições democráticas. Neste período de oito dias, os nigerianos são chamados a eleger novos governadores, novos representantes federais e um novo presidente. Trata-se de um momento histórico que traduzirá, pela primeira vez, a passagem do poder entre forças democráticas. Com as eleições de 1999, a Nigéria abandonou um longo período de insígnias militares e abraçou a vontade popular traduzida não só mas também na vontade geral dos votos. Então, a democracia nigeriana venceu e exibiu um grau de confiança apreciável: cidadãos davam boas-vindas a um sistema que esperavam vir garantir direitos, inclusão e transparência. Esperavam que essa senhora mítica lhes mostrasse um processo de confiança política, estabilidade e prosperidade.
Oito anos volvidos e apesar das debilidades dos processos eleitorais, os nigerianos foram e serão chamados às urnas novamente, ainda esperançosos no voto e na expectativa de limitar a alienação das suas instituições democráticas. Desta vez, trata-se de eleger representantes do povo – ao nível estadual e federal –, mas também de recuperar o capital de confiança roído pelas rivalidades e afinidades étnicas, religiosas e geográficas, pela corrupção e pelo clientelismo. Agora trata-se de reconquistar a satisfação e confiança de uma população privada de oportunidades, manchada de violência e desgastada pelos escândalos de corrupção e rivalidades pessoais. Por ora, a primeira parte das eleições (realizadas no passado sábado) deixam-nos um sabor de esperança, um vento de Primavera que superou as expectativas de uma Nigéria reencontrada neste barómetro de estabilidade e construção deste imenso e complexo estado africano. No entanto, mais importante do que o ritual que se repete aos quatro anos, a democracia terá de impor-se como um verdadeiro mecanismo de gestão social capaz de transpor as rivalidades sociais para traduzir-se num projecto de harmonia e desenvolvimento colectivos.

A Páscoa dos líderes

Ontem comemorou-se a Páscoa. Para os cristãos, comemorou-se a paixão e ressurreição de Cristo, que carregou a cruz e nela foi pregado num acto de fé e salvação do seu povo. Para os judeus, a Páscoa simboliza a fuga do Egipto, a odisseia de Moisés e do seu povo para a terra prometida, para escapar à submissão, à desigualdade e à indignidade. Em ambas as religiões, evocam-se os líderes que moldaram dois povos e que plantaram a raiz do que ainda hoje é parte da nossa civilização. Efectivamente, foram líderes que ao seu tempo não só atravessaram mares, desertos e subiram a montanhas, como aceitaram derramar o seu sangue em nome da salvação, em nome de um caminho, em nome de um projecto e de um destino para os seus povos. Se trago o registo destas duas figuras sobejamente conhecidas, é porque ao ouvir os telejornais, as notícias da rádio e ao ler os jornais, ouvi e li sobre a Páscoa, como celebrações religiosas e, para alguns, uma festa pagã. Não ouvi falar de uma celebração laica, a celebração da coragem de povos, a celebração da determinação dos líderes. Líderes que hoje tardam a aparecer, principalmente em África, ou em países onde a carência de projecto se faz sentir no quotidiano da sobrevivência e dos pesados desafios da existência abaixo da dignidade humana. Não me posso esquecer que enquanto falo, jazem crianças em camas de hospital com malária, um adulto é infectado com o VIH/Sida, milhares estão deslocados, centenas morrem à fome, incontáveis seres humanos são traficados como mercadoria e uma infinidade de males que indignariam Moisés e Jesus Cristo vão-se sucedendo sem que os ditos líderes da actualidade, que ostentam o título de presidentes, ministros e directores subam ao Monte Sinai ou assumam a cruz que precisavam carregar. Infelizmente, nem Moisés nem Jesus Cristo aparecerão para nos livrar desses males. Aquelas personagens históricas tomaram os seus títulos não para se servirem dos seus povos, mas parar servir aqueles que justificaram a sua liderança. Hoje temos pessoas que ostentam títulos, dizem-se Presidentes e Ministros. Alguns são eleitos e são acolhidos como líderes democráticos, mas vários ainda ostentam títulos usurpados – aqueles a quem chamamos ditadores – ou que ultrapassaram os limites desses títulos – aqueles a quem chamamos tiranos. Infelizmente, na Páscoa não pude celebrar os líderes africanos porque África sofre debaixo de uma maldição de liderança vazias de ânimo e missão. Por isso, resta-me a fé, a coragem e a ousadia cívicas para exigir aos Ministros e Presidentes que sejam mais que títulos pendurados nos seus gabinetes e que carreguem pelo menos o peso das suas responsabilidades.

segunda-feira, 2 de abril de 2007

PORTUGAL, o menos imperfeito dos perfeitos

De repente, em plena semana pascoal, a minha esperança na próxima cimeira euro-africana parece ressuscitada. É que, PORTUGAL, enquanto anfitrião da cimeira, apresenta-se como um pequeno país na charneira do desenvolvimento que pode mesmo usar a diplomacia para colocar as preocupações do desenvolvimento num patamar de sucesso efectivo e desmentir alguns dos recentes temores. Quando PORTUGAL tomar a presidência europeia, áfrica pousará os seus olhos no governo português em busca de um sinal. Seja ele de esperança ou de verdadeira ousadia, parece-me que esse sinal já está dado: atentemos ao que nos diz o ÍNDICE DE COMPROMISSO COM O DESENVOLVIMENTO DE 2006, que reflecte o esforço de uns países em prol da felicidade de outros. De acordo com este índice anual do CENTRO PARA O DESENVOLVIMENTO GLOBAL, de uma lista de 21 países considerados desenvolvidos, PORTUGAL ocupa uma distinta 16.ª posição. Isto dito desta forma, parece modesto, mas mergulhemos nas profundezas de uma análise mais submarina.
Entre 2003 e 2006, PORTUGAL pode orgulhar-se de ter sido o 6.º país que mais cresceu no índice, ficando ao lado do esforço do japão e da suécia, e à frente de países como a noruega, a dinamarca, a finlândia ou mesmo o canadá: países de longe mais ricos e desenvolvidos que PORTUGAL. Para além disso, porque a ajuda não se resume à política do cheque, PORTUGAL pode orgulhar-se do 2.º lugar relativamente à abertura do seu mercado às importações de têxteis, ao 6.º lugar quanto à contribuição para a segurança global, ao 10.º lugar na criação e transmissão de novas tecnologias. e vale a pena também mencionar que apesar da baixa taxa de absorção de imigrantes, PORTUGAL posiciona-se em 7.º lugar na recepção de estudantes dos países em desenvolvimento. A importância deste índice é, para simplificar, o seguinte: PORTUGAL é dos menos desenvolvidos entre os desenvolvidos, dos menos ricos entre os ricos, mas apesar disso tem assumido o esforço e o compromisso de ajudar o desenvolvimento de outros povos. É que, não sendo rico nem país influente, o índice mostra que PORTUGAL entende que o desenvolvimento resulta de um verdadeiro ecossistema que ajude os povos menos afortunados a respirar; um ecossistema que apela ao cheque financeiro, mas também à abertura ao comércio e às parcerias entre os governos bons. Como diz se no relatório do índice, nenhum país é perfeito! No entanto, este país pouco perfeito pode ensinar outros mais ricos e perfeitos o caminho a um entendimento comum para a busca da felicidade global.

sexta-feira, 30 de março de 2007

Índice de Compromisso com o Desenvolvimento, 2006

Nenhum país é perfeito, mas há uns mais comprometidos com o desenvolvimento que outros. A ler no Commitment to Development Index 2006

responsabilidade social das empresas petrolíferas

A questão da Responsabilidade Social já foi glosada neste blog. Fica a contestação das empresas responsáveis, para efeitos de honestidade intelectual. Para ler e ir acompanhando.

quinta-feira, 29 de março de 2007

Ainda na senda de Angola VIPC

A pedido de muitas famílias, aqui vai mais um documento da nossa querida amiga: converti-me de vez: Angola: Country Analysis Brief, no EIA americano! Estou apaixonado pelo uso petro-diplomático-estratégico-comercial do oil angolano. É o que se chama uma cosmo-utilização do petro poder.
Desabafo (a modos de wishful ongoing, first draft, prototype thinking...): neste mundo tão capitalizado, talvez não fosse má ideia Angola assumir um papel de motor entre os PALOP! Estou apenas a tentar extrapolar a tese (de mestrado, interessante: estou ansioso por ler o livro), que um amigo está a desenvolver num âmbito mais modesto. Diria que o poder (power = energy) de Angola pode ser utilizado de forma mais partilhada quanto aos resultados, desde que...(Alguém me ajude a pensar nisto, ou a por a ideia de lado). É que já estou farto de ouvir falar da CPLP: nome difícil de articular, faz lembrar fórmulas químicas exotéricas, e com aquele conteúdo vag'eloquente, arenoso.. e porque não dizê-lo de vez: pantanoso!
Angola é o que está a dar: bora daí. Façamos da Angola VIP uma Angola VIPC-LOP (a VIPC dos PALOP).
Abraços, tenho de ir trabalhar! É para isso que ainda me pagam!
p.s. Antes: para quem não acredita nisto, veja o 1st round ganho por K.O. a Portugal: habemos carta! Agora Cabo Verde é o menino que se segue, a Guiné-bissau esperneia e "está disponível", enquanto STP está a pensar (como sempre... lembro-me que a pensar morreu um daqueles animais bem simpáticos). Santa ignorância: não sei o que se passa com Moçambique. Brasil é outro campeonato, quando me inscrever nessa liga darei notícias.

segunda-feira, 26 de março de 2007

Dois hinos, uma mensagem

ontem juntei-me ao coro do HINO DA ALEGRIA para celebrar os 50 anos da união europeia. essa união que em 1957 começou como uma comunidade: um sonho de paz tornado realidade pela vontade política de unir um continente desavindo, perdido em batalhas ancestrais e que hoje é, como lembrou o presidente da república português uma âncora de paz e um conteúdo de valores partilhados, liberdade e solidariedade. o que para alguns não passava de uma utopia, é hoje uma realidade que atravessa todas as dimensões da nossa vida política, económica, social e cultural.
não me esqueço que o projecto não se fez sem dificuldades, esforços, consertos e compromissos e que o futuro não está isento de novos desafios, dificuldades e mais compromissos. no entanto, a história mostra-nos que nos momentos decisivos, a utopia guia o compromisso e juntos vão tartarugando o projecto comum.
depois dessa comemoração europeia, olho para a minha herança africana e anseio pelo dia em que cantarei os 50 anos de VAMOS NOS UNIR E CELEBRAR JUNTOS: o hino da união africana. o hino que enuncia a utopia pensada e iniciada em 25 de maio de 1963 como a organização de unidade africana e que em 2002 se tornou na união africana.
a união exprime um renovado compromisso político africano de superar o pesado legado histórico cunhado em letra de lei em 1885, em Berlim, rumando desta vez para uma narrativa com voz própria, em torno da unidade e da solidariedade entre os povos e países africanos, num intencional sentido de paz, segurança e estabilidade do continente.
para superar a história, o desafio da integração africana deve olhar para as lições europeias e delas pode aprender que o destino da integração política não pode deixar para trás os povos e as pessoas que integram um espaço de vizinhança, onde os estados, as nações e as fronteiras são convidados a construir um condomínio de objectivos, sonhos e realidades, respeitando um passado longo que os separa, mas avançando para um futuro ainda mais longo que os une pelo umbigo.