segunda-feira, 16 de abril de 2007

A Nigéria reencontrada

A Nigéria encontra-se num verdadeiro teste de regime. Nos dias 14 e 21 deste mês, o povo nigeriano foi e será chamado a dar provas da vitalidade e credibilidade das suas instituições democráticas. Neste período de oito dias, os nigerianos são chamados a eleger novos governadores, novos representantes federais e um novo presidente. Trata-se de um momento histórico que traduzirá, pela primeira vez, a passagem do poder entre forças democráticas. Com as eleições de 1999, a Nigéria abandonou um longo período de insígnias militares e abraçou a vontade popular traduzida não só mas também na vontade geral dos votos. Então, a democracia nigeriana venceu e exibiu um grau de confiança apreciável: cidadãos davam boas-vindas a um sistema que esperavam vir garantir direitos, inclusão e transparência. Esperavam que essa senhora mítica lhes mostrasse um processo de confiança política, estabilidade e prosperidade.
Oito anos volvidos e apesar das debilidades dos processos eleitorais, os nigerianos foram e serão chamados às urnas novamente, ainda esperançosos no voto e na expectativa de limitar a alienação das suas instituições democráticas. Desta vez, trata-se de eleger representantes do povo – ao nível estadual e federal –, mas também de recuperar o capital de confiança roído pelas rivalidades e afinidades étnicas, religiosas e geográficas, pela corrupção e pelo clientelismo. Agora trata-se de reconquistar a satisfação e confiança de uma população privada de oportunidades, manchada de violência e desgastada pelos escândalos de corrupção e rivalidades pessoais. Por ora, a primeira parte das eleições (realizadas no passado sábado) deixam-nos um sabor de esperança, um vento de Primavera que superou as expectativas de uma Nigéria reencontrada neste barómetro de estabilidade e construção deste imenso e complexo estado africano. No entanto, mais importante do que o ritual que se repete aos quatro anos, a democracia terá de impor-se como um verdadeiro mecanismo de gestão social capaz de transpor as rivalidades sociais para traduzir-se num projecto de harmonia e desenvolvimento colectivos.

A Páscoa dos líderes

Ontem comemorou-se a Páscoa. Para os cristãos, comemorou-se a paixão e ressurreição de Cristo, que carregou a cruz e nela foi pregado num acto de fé e salvação do seu povo. Para os judeus, a Páscoa simboliza a fuga do Egipto, a odisseia de Moisés e do seu povo para a terra prometida, para escapar à submissão, à desigualdade e à indignidade. Em ambas as religiões, evocam-se os líderes que moldaram dois povos e que plantaram a raiz do que ainda hoje é parte da nossa civilização. Efectivamente, foram líderes que ao seu tempo não só atravessaram mares, desertos e subiram a montanhas, como aceitaram derramar o seu sangue em nome da salvação, em nome de um caminho, em nome de um projecto e de um destino para os seus povos. Se trago o registo destas duas figuras sobejamente conhecidas, é porque ao ouvir os telejornais, as notícias da rádio e ao ler os jornais, ouvi e li sobre a Páscoa, como celebrações religiosas e, para alguns, uma festa pagã. Não ouvi falar de uma celebração laica, a celebração da coragem de povos, a celebração da determinação dos líderes. Líderes que hoje tardam a aparecer, principalmente em África, ou em países onde a carência de projecto se faz sentir no quotidiano da sobrevivência e dos pesados desafios da existência abaixo da dignidade humana. Não me posso esquecer que enquanto falo, jazem crianças em camas de hospital com malária, um adulto é infectado com o VIH/Sida, milhares estão deslocados, centenas morrem à fome, incontáveis seres humanos são traficados como mercadoria e uma infinidade de males que indignariam Moisés e Jesus Cristo vão-se sucedendo sem que os ditos líderes da actualidade, que ostentam o título de presidentes, ministros e directores subam ao Monte Sinai ou assumam a cruz que precisavam carregar. Infelizmente, nem Moisés nem Jesus Cristo aparecerão para nos livrar desses males. Aquelas personagens históricas tomaram os seus títulos não para se servirem dos seus povos, mas parar servir aqueles que justificaram a sua liderança. Hoje temos pessoas que ostentam títulos, dizem-se Presidentes e Ministros. Alguns são eleitos e são acolhidos como líderes democráticos, mas vários ainda ostentam títulos usurpados – aqueles a quem chamamos ditadores – ou que ultrapassaram os limites desses títulos – aqueles a quem chamamos tiranos. Infelizmente, na Páscoa não pude celebrar os líderes africanos porque África sofre debaixo de uma maldição de liderança vazias de ânimo e missão. Por isso, resta-me a fé, a coragem e a ousadia cívicas para exigir aos Ministros e Presidentes que sejam mais que títulos pendurados nos seus gabinetes e que carreguem pelo menos o peso das suas responsabilidades.

segunda-feira, 2 de abril de 2007

PORTUGAL, o menos imperfeito dos perfeitos

De repente, em plena semana pascoal, a minha esperança na próxima cimeira euro-africana parece ressuscitada. É que, PORTUGAL, enquanto anfitrião da cimeira, apresenta-se como um pequeno país na charneira do desenvolvimento que pode mesmo usar a diplomacia para colocar as preocupações do desenvolvimento num patamar de sucesso efectivo e desmentir alguns dos recentes temores. Quando PORTUGAL tomar a presidência europeia, áfrica pousará os seus olhos no governo português em busca de um sinal. Seja ele de esperança ou de verdadeira ousadia, parece-me que esse sinal já está dado: atentemos ao que nos diz o ÍNDICE DE COMPROMISSO COM O DESENVOLVIMENTO DE 2006, que reflecte o esforço de uns países em prol da felicidade de outros. De acordo com este índice anual do CENTRO PARA O DESENVOLVIMENTO GLOBAL, de uma lista de 21 países considerados desenvolvidos, PORTUGAL ocupa uma distinta 16.ª posição. Isto dito desta forma, parece modesto, mas mergulhemos nas profundezas de uma análise mais submarina.
Entre 2003 e 2006, PORTUGAL pode orgulhar-se de ter sido o 6.º país que mais cresceu no índice, ficando ao lado do esforço do japão e da suécia, e à frente de países como a noruega, a dinamarca, a finlândia ou mesmo o canadá: países de longe mais ricos e desenvolvidos que PORTUGAL. Para além disso, porque a ajuda não se resume à política do cheque, PORTUGAL pode orgulhar-se do 2.º lugar relativamente à abertura do seu mercado às importações de têxteis, ao 6.º lugar quanto à contribuição para a segurança global, ao 10.º lugar na criação e transmissão de novas tecnologias. e vale a pena também mencionar que apesar da baixa taxa de absorção de imigrantes, PORTUGAL posiciona-se em 7.º lugar na recepção de estudantes dos países em desenvolvimento. A importância deste índice é, para simplificar, o seguinte: PORTUGAL é dos menos desenvolvidos entre os desenvolvidos, dos menos ricos entre os ricos, mas apesar disso tem assumido o esforço e o compromisso de ajudar o desenvolvimento de outros povos. É que, não sendo rico nem país influente, o índice mostra que PORTUGAL entende que o desenvolvimento resulta de um verdadeiro ecossistema que ajude os povos menos afortunados a respirar; um ecossistema que apela ao cheque financeiro, mas também à abertura ao comércio e às parcerias entre os governos bons. Como diz se no relatório do índice, nenhum país é perfeito! No entanto, este país pouco perfeito pode ensinar outros mais ricos e perfeitos o caminho a um entendimento comum para a busca da felicidade global.