domingo, 26 de novembro de 2006

A suga de imigrantes com cérebro

Agora que se conhece o documento estratégico para as três próximas presidências da União Europeia, confirma-se que África fará parte das prioridades diplomáticas europeias. Com efeito, África e imigração ilegal são sinónimos de preocupação, dinheiro e medidas de cooperação. No entanto, entre as contas e cantos da relação bilateral, adivinho que a Europa não deixará de fazer o seu jogo duplo: a) fechar as portas aos imigrantes pés descalços e b) abri-las com convites dourados aos imigrantes com cérebros, especialidades, conhecimentos e técnicas para as empresas, universidades e serviços europeus. Prioritário ou não, as políticas de cooperação bilateral passarão ao lado das necessidades de também inverter esta drenagem de cérebros africanos ou de encontrar mecanismos que ajudem os africanos a criarem condições de investimento e aproveitamento dos seus melhores recursos humanos. Tarefa essa que por todos os motivos de desenvolvimento se exige prioritariamente aos africanos. Ou seja, África e Europa insistem em não entender que esta drenagem de cérebros contribui para manter o estado das coisas: um desenvolvimento baixo e uma dependência externa. Persistindo-se na delapidação das consideradas riquezas para o séc. XXI e mais uma vez relegando os manuais da história e da economia para o esquecimento, os africanos criam as condições ideiais para que daqui por 500 anos venham mais uma vez culpar a Europa pelo seu atraso, esquecendo-se que, no quadro dos desafios actuais, África não dispõe de 500 anos. É caso para dizer: o que para uns é desperdício, para outros é riqueza. Por isso, não me espanta que a Conferência Ministerial África-Europa para a Migração e Desenvolvimento realizada esta semana tenha dado mais importância à imigração ilegal e aos cálculos financeiros, do que a uma genuína tentativa para estancar a suga de imigrantes africanos com cérebros. E que os líderes africanos se tenham preocupado mais uma visão assistencialista do que construtiva do seu futuro.
[Baseado na nossa crónica transmitida na rúbrica Ao Calor de África da RDP-África de 20 de Novembro de 2006]

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