sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

Beleza das sombras

O mundo é uma mescla de sombras e aparências. Não há tonalidades de cores; só cinzentos entre pretos e alguma luz branca. Somos todos filhos da Caverna de Platão. Mas fingimos que vemos cores num mundo de preconceitos, ismos e coiso
(transformismos de fantasia solipsíquica e realidade delirante.

Depois, há formas que nos capturam os sentidos: fazem-nos escravos das sombras e do silêncio que lhes envolvem e da luz derramada aos seus pés.
Como que arrependido...)
Tudo parece uma ilusão: a beleza e as sombras num bailado único.

Dança da chuva

A diferença entre dançar para que caia chuva e ficar a espera dela conta-se em dólares. Os Índios Seminole da Florida compraram os famosos Hard Rock Café. Por cerca de 770 milhões de euros, estes índios (que se vêem confinados a uma reserva, após intensas guerras com o governo federal estad’unidense)
passarão a governar os 124 cafés, quatro hotéis, dois casinos e uma sala de espectáculos. O Hard Rock Café está presente em cerca de 40 países, incluindo Portugal
(quem ainda o não viu na Praça dos Restauradores, ou anda distraído ou conheceu o Cinema Condes)
Não conheço a história dos Seminole nem como ganharam a riqueza que possuem; o que sei é que não ficaram a espera que a chuva caísse na Florida para construir a ponte entre a tradição e o capitalismo. A propósito não posso deixar de citar Henry Kissinger no seu estudo Meaning of History
A experiência da Liberdade permite-nos ultrapassar o sofrimento do passado e as frustrações da História.

terça-feira, 12 de dezembro de 2006

The “No Magic Formula” formula

Welcome to the American new beginning of history. And it goes like this: About 5 years ago, a bunch of terrorists attacked the US, and the attack earthquaked the American mith of security. That day has become the day that changed the world: 9/11. Fear prevailed over reason. Within a while GwB, 43, declared war on terror, than smashed the Taliban in Afeganistan, embezzled “weapons linked with terror” to go after Saddam in Iraq and engaged in a time, life, money and power consuming warfare. But in fact, it was not 9/11, but 20/03 (beginning of the so called ''Operation Iraqi Freedom") that is going to enjoy the title of the day that changed the world: here's my why.
Five years, and a many absurds later (including disrespect for domestic and international rule of law), the world hasn't changed (at least not the way annalists and policy makers expected). The US has been as unilaterally arrogant as since 1989/1991 (the post cold war era), been an Axis of Evil instigator, but still enjoys the supremacy of the only global power. However, because of 20/03 that may change. I have read it from start to end and here is what Baker/Hamilton (officially the Iraq Study Group) Report has to offer to the America:
"There is no magic formula to solve the problems of Iraq. No one can guarantee that any course of action in Iraq at this point will stop sectarian warfare [meaning civil war], growing violence, or a slide toward chaos. There must be a renewed and sustained commitment by the United States to a comprehensive Arab-Israeli peace on all fronts. The United States must not make an open-ended commitment to keep large numbers of American troops deployed in Iraq. Miracles cannot be expected. The challenges are daunting. There is no guarantee for success in Iraq. Total attacks in October 2006 averaged 180 per day, up from 70 per day in January 2006. Some 3,000 Iraqi civilians are killed every month. Al Qaeda is responsible for a small portion of the violence in Iraq. The Mahdi Army, led by Moqtada al-Sadr, may number as many as 60,000 fighters. Approximately 141,000 US military personnel are serving in Iraq. Security is lacking. Corruption is rampant. Capacity is inadequate. Iran is negotiating with the United States in the streets of Bagdad. To date, the United States has spent roughly $ 400 billion on the Iraq war. Estimates run as high as $ 2 trillion for the final cost of the US involvement in Iraq. The ability of the United States to shape outcomes is diminishing. Time is running out. United States must build a new international consensus for stability in Iraq and the region. As an instrument of the New Diplomatic Offensive, an Iraq International Support Group should be organized immediately. The Support Group should consist of Iraq and all states bordering Iraq, including Iran and Syria…the five permanent members of United Nations Security Council; the European Union. Other countries…could also become members. The Support Group should call on the participation of the office of the United Nations Secretary-General in its work. The Support Group should actively engage Iran and Syria in its diplomatic dialogue, without preconditions." (these are of course my choice of remarking sentences of the report, these are excepts, not a full transcript of it, that you may enjoy reading yourself at United States Institute of Peace.)
20/03 has started changing the (post-9/11) world and this report makes the big picture of it: after US stepped in Iraq, the world power sharing as started to change and as soon America steps out (or even earlier when it announces the disengagement of) the Middle East, the world will never be the same again. One thing is for sure: the Baker/Hamilton Report show us glances and shadows of a new world that GwB started to breed in 20/03 and as far as history goes Iran and Syria are not there to make a pro bono, viewer-friendly, face-lift over US failures in Iraq.
Time is running out, says the report. What’s your call, Mr. Bush?

quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

Notifique-se!

Uma pérola! A eficiência do sistema judiciário português: ao chegar ao céu, o morto terá de fazer prova do seu estado de falecido. E eis que por milagres da técnica jurídica, Portugal ajuda S. Pedro a desfazer a dúvida. Simplex?

terça-feira, 5 de dezembro de 2006

O Jardim das Delícias

Hieronymus Bosch pintou-o circa 1504. Rute e Diana, lembram-se do Museu do Prado, em Madrid? Fonte: www.boschuniverse.org

Revogando Marques Mendes...com efeitos retroactivos

As recentes afirmações políticas, com Marques Mendes à cabeça,
E olhe que estamos a falar do líder de um tal PPD/PSD
(um diz que é partido social-democrata português)
para que “o processo Camarate” seja julgado, apesar de o caso ter sido declarado prescrito pela mais alta instância da justiça civil/criminal portuguesa, o Supremo Tribunal de Justiça, são assombrosas (varreram-se-me expressões mais aluvadas para o caso). Expressões como «o que importa é que seja possível que o assunto vá a julgamento», com a aquiescência de um famoso Professor de Direito
(constitucional, ao que diz)
arrepiaram-me os cabelos e fizeram-me pensar
Deus, aterrei no Iraque, ou
– Que Diabos, estou na Venezuela, a assistir a entronização de Chávez. E por aqui me fico, porque as ditas revelam um supremo desconhecimento (quero dizer desprezo) da lei, para não dizer um vergonhoso atropelo pelo estado de direito.
Em socorro dos líderes de papel que vão pu(lu)lando pela direita e de um certo Professor de Direito (constitucional, ao que diz) deixo, à laia de “Escolhas de…” umas comezinhas sugestões de leitura, para que o estudo do direito faça de facto luz no túnel opaco dos joguetes políticos e nas prédicas pouco lúcidas de alguns dos mais idolatrados opinion makers (ou serão antes opinion spinners?) ou os ajude a justificar o título :
Artigo 29.º, das Edições Constituição da República Portuguesa
Artigo 2.º, das Edições Código Penal e
Artigo 5.º, das Edições Código de Processo Penal
(tudo de leitura light, como eles mesmos tratam o assunto)
É assim: os políticos
(também os jornalistas, comentadores, quiçá o Zé, tão evocado noutros congressos do venerando partido)
deveriam saber que o vale tudo não tem lugar no estado de direito. Mas pelos vistos, o surto de populismo chegou aos líderes "do continente" e vai-nos adentrando pelos media, como um elefante atropelando as “conquistas de Abril”. Com políticos destes, mais vale ter tribunais que erram, porque estes ainda nos conseguem livrar dos ímpetos demagógicos que de quando em vez arrendam espaço nas mentes de alguns que nos querem governar.
pós escritos: Já que estamos em maré de propostas, aqui vou: sugiro que a academia portuguesa possa retirar títulos aos Doutores… com efeitos retroactivos, qué prá ninguém ficar a rir. A qualidade do ensino em Portugal também ganha se os Professores de Direito, mesmo com a bata de políticos, colocarem maior rigor nas suas prelecções. Há contrastes que valem a pena sublinhar: Vitalino Canas (in Fórum TSF, de 5 de Dezembro) deu-nos uma lição do que é ser político e académico, sem despir o rigor.

St = Qt (Pt - 29)

A fórmula é simples: subtrair parte dos lucros das companhias petrolíferas para reduzir a factura petrolífera dos países africanos importadores. A ideia foi lançada pelo Presidente senegalês, (Sim!, o mesmo que esteve em visita de Estado em São Tomé e Príncipe na semana passada) Adbulaye Wade promete causar polémica As petrolíferas não são misericórdias,… Os estados exportadores têm a sua própria agenda, problemas conflitos e classe parasitária,… O baixo desempenho africano é culpa da endemias trans-temporais como a corrupção, falta de liderança, o neo-patrimonialismo, a economia rendeira, as guerras, etc…. mas tem méritos e levanta questões de justiça. Expliquemo-nos: Wade pretende que os países produtores africanos, as petrolíferas e a comunidade internacional acordem que os lucros das petrolíferas sejam calculados pela fórmula St = Qt (Pt - 29), já baptizada de Fórmula Wade. [em que S: lucro; Q: produção africana; P: preço do barril de petróleo; t: determinado ano; e 29 é o preço médio do barril em 2003] O presidente Senegalês alega em sua defesa que (passamos a citar em itálico e sem aspas) — é indecente e imoral que as petrolíferas continuem a embolsar biliões em lucros crescentes desde 2003 (a parte do crescente desde 2003 é minha) ou, em inglês: indecent and immoral that oil giants were pocketing billions of profits e que, por seu lado, os Estados importadores continuam a pagar contas cada vez mais elevadas. Referindo-se ao caso do seu país, compara: em 2006 um americano paga três dólares por galão e um senegalês paga o dobro pelo mesmo galão; num país com carências energéticas (vivendo em constante corte e cola energético) e onde os cidadãos usufruem de um rendimento anual per capita de 850 dólares (em números redondos). Trata-se assim de um pedido de justiça, de sustentabilidade, de um esforço de distribuição dessa riqueza gerada por factores de entre aspas mercado que as petrolíferas são convidadas a fazer. Efectivamente, numa conjuntura em que o grito — a era do petróleo barato já lá vai, a ideia não é fazer desses Estados uma espécie de Robin dos Bosques, tirando lucros às milionárias petrolíferas para dar aos pobres (e, em n dos casos, mal governados Estados africanos) mas pedir aos Xerife de Nottingham que aparta um pouco da sua riqueza, evitando a revolta dos pobres: repartir os custos do aumento do preço do barril para aliviar a factura dos países mais aflitos. (Ah, e fique sabendo que, na proposta, o dinheiro vai direitinho para um fundo e não para qualquer conta rendeira, quiça na Suiça, sem querer tirar o mérito dos também esforçados paraísos fiscais). A proposta é audaz, apela à justiça, mas antecipo que será difícil tornar o Xerife em herói da floresta. Dito isso, tenho por certo que o desafio do desenvolvimento e a responsabilidade pelo seu fracasso é, em primeiro lugar, dos próprios líderes africanos e da sua endógena capacidade de fazer desviar para o exterior as culpas e incapacidades da sua gestão.

Para saber mais sobre o assunto: Veja a Lista dos Países Produtores Africanos e leia as coberturas jornalísticas na Afrol News, na Reuters, na Voice of America, na allfrica. Infelizmente, em português só consegui encontrar a notícia publicada no Corrier Internacional, n.º 87 (1 - 7 de Dezembro de 2006). Se for a correr, ainda pode comprar até ao final da semana.

segunda-feira, 4 de dezembro de 2006

W.C. out of order

Enquanto a América dormia em cima do pesadelo do Médio Oriente, a América do Sul, a de Lula (Brasil), de Chávez (Venezuela), de Ortega (Nicarágua), dos Castro (Cuba) alinham entendimentos à esquerda, com mais ou menos populismos, mas com uma manifesta vontade de se livrarem da tutela imperial do vizinho que a Norte, os EUA e do seu imperialismo regional, tão abundantemente glosado por Chávez, ontem reeleito com slogans anti-imperialistas e promessas de uma revolução boliviriana para a região. As cores do mapa político da região são claras: os votos no Brasil, Bolívia, Chile, Venezuela, Equador, Argentina, Uruguai, Peru e Nicarágua sublinham bem a viragem da região a um socialismo do século XXI. Um socialismo que promete aos 110 milhões de sul-americanos que vivem com USD 1 por dia maior igualdade social, mais distribuição da riqueza, nacionalizações, restrições aos lucros dos privados; tudo isso em perene convívio com a corrupção e com formas de défice democrático. Ainda assim, uma esquerda que promete mais aos pobres. Com os adventos das democracias, da abertura de mercado e da relativa paz na região, a tendência de aproximação dos interesses das duas Américas galopavam no mesmo sentido, o que levou George W. a colocar a Latin América on the top of the US foreign policy agenda. Porém, o terrorismo de 2001, recalibrou as atenções de Washington, desviando as atenções as atenções de George W. e seus falcões para o Médio Oriente. Foi o início do esvaziamento da acalentada convergência dos interesses. Hoje, não é difícil afirmar que o W.C. (Washington Consensus) está fora de serviço, is out of order: rebentou-se-lhe o cano das injustiças que ajudou a criar! Resta saber como os gringos do norte, antigos donos do chamado quintal americano, reagirão a estes ventos calientes que sopram da América do Sul e saber se estes serão fortes para erigir na região um mundo pós-(uni)polar, mais justo, mais do interesse das suas populações.

domingo, 3 de dezembro de 2006

A armadilha da ignorância

No passado dia 1 de Dezembro comemorou-se mais um Dia Mundial da SIDA. Nesse dia, lembramo-nos das causas, dos números, dos comportamentos de risco, das necessidades de prevenção, de financiamento, de medicamentos, de acesso a esses medicamentos e do longo caminho para enfrentar essa doença que teima em matar milhões de pessoas por ano. Nesse dia também nos lembramos das vítimas da nossa ignorância. Lembramo-nos que aqueles que vivem com a SIDA são, de alguma forma, rejeitados, discriminados pelas suas sociedades, pelos seus colegas, pelos seus amigos. São pessoas que assumindo a doença vêem negado o seu direito a uma sã convivência social: negamos-lhes os empregos, o acesso à habitação, as relações sociais e os cuidados de saúde,... Negamos-lhes o viver o dia seguinte. Nesse contexto, assumir a SIDA é um acto de auto-condenação através do qual o seropositivo se condena a mais uma morte: uma morte social, que se soma à morte física que lhe será fatal. Por isso, em vez de assumir a doença e procurar o tratamento ou tão só o amparo social, o seropositivo prefere silenciar a doença. E infelizmente, pensamos que basta-nos discriminar um seropositivo para que fiquemos mais protegidos, mais seguros. Mas é precisamente o contrário: devemos criar em nós as condições para assumirmos um combate firme à doença. E isso passa por nos informarmos, por nos educarmos, por nos esclarecermos. Não é demais lembrar que o estigma e a discriminação são sinais de ignorância que só uma educação para a SIDA nos permitirá ultrapassar. Cada vez que discriminamos um seropositivo, assumimos que não sabemos o que é a doença, como ela se propaga, nem como nos proteger, continuando assim com comportamentos de risco e a sermos potenciais vítimas do vírus. Dar dignidade social aos seropositivos é um sinal de emancipação cívica, uma tarefa de pais, filhos, sociedade e governos, porque só assim tiramos da clandestinidade a doença, damos dignidade aqueles que já são vítimas e não caimos nós na armadilha da ignorância.

sábado, 2 de dezembro de 2006

Contra a violência doméstica

Exorcizemos o mito machista da sociedade santomense
A violência doméstica traduz-se na prática de actos velados ou explícitos que abusos físicos, psicológicos, sociais ou económicos de um familiar sobre o outro seja contra filhos menores, (contra o cônjuge, ou contra os próprios progenitores) . Não se trata apenas de abusos ou violência sexuais, ofensas físicas, maus tratos. É também abusado aquele que é vítima de violência (ou controlo) sócio-económica - só gastas aquilo que eu deixo, só te relacionas com quem eu permito são exemplos dessa violência, exemplos de um controlo de um dos membros da relação doméstica sobre a vida social e dos recursos económicos do outro. Mas também a negligência, o abandono e a humilhação pública são formas de violência doméstica. O medo, a vergonha e a humilhação sociais causam na vítima o receio da denúncia, criando nela um sentimento de culpa, ou de aceitação daquelas práticas - ele (porque na maioria das vezes, dizem as estatísticas: 92% dos casos são perpetrados pelo homem) ele deve ter razão, eu mereci, não me portei bem, etc... A vítima da violência torna-se assim vítima doméstica, social e de si mesma. No entanto, vale a pena denunciar essa prática: A VIOLÊNCIA DOMÉSTICA É UM ACTO CRIMINOSO, É UM ACTO DE SUBJUGAÇÃO DE UM SER HUMANO PELA FORÇA. O elo mais fraco, porque depende social ou economicamente, vê-se reduzido a uma coisa na qual o agressor mostra - afinal quem manda aqui, descarregando a sua fúria, um tal "impulso descontrolado", esquecendo-se da fragilidade da vítima, muita das vezes sem qualquer opção de defesa. No que toca à violência doméstica contra a mulher, não nos podemos esquecer que está em causa um dos pilares da sociedade: a igualdade e a liberdade (entre sexos)! O tema merece por isso uma abrangente discussão na sociedade santomense (como de resto o tem sido transversalmente pelo mundo), porque estão em causa valores fundacionais da sociedade: os valores da constituição da família; o da construção de um Estado justo. Urge reflectir nos modos de proteger as vítimas, deixar de estigmatiza-las em nome de uma tradicional dominação patriarcal (falsa, se olharmos para o modo como os ditos patriarcas são parcos no seu amparo familiar na sociedade santomense. A bem disto tudo, deixemos cair o mito machista da sociedade santomense)